Não há regras para boas fotos, apenas há boas fotos
(Ansel Adams)

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

UMA FOTO, UMA LEITURA

Foto - Antonio Tedim
Texto - Rui Santos (www.cognitare.blogspot.com)



O MAGUSTO

A tarde solarenga quase que engana o frio gélido que entrou de rompante neste outono que apanhou o comboio tarde demais. Há um frio que refresca as nossas caras revitalizando o nosso corpo adormecido pelas roupas pesadas que cobrem os físicos habituados à leveza das roupas de veraneio. À entrada para o carro, deixo o vento acariciar-me a cara, aprecio aquele frio que me obriga a reagir com um aumento da vitalidade, esqueço-me de entrar no veículo ao ver a palete de cores que cobrem as árvores, do amarelo ao castanho, cada folha é uma cor distinta e, todas juntas uma imagem única. A avenida mostra-se nua e sem preconceitos, ladeada e protegida por aquela beleza natural que tanto desvalorizamos.

O Outono chegou há tanto tempo e só hoje percebo, só hoje lhe dou as boas-vindas e, ele, gentilmente, brinda-me com esta paisagem que estava à minha frente desde o início. Os carros, deslocados desta fotografia são ruído de imagem. Entro e arrancámos neste Verão de São Martinho prontos para celebrar o famigerado Magusto junto de amigos. A festa popular já não é a mesma, já não andamos a percorrer as adegas a beber o vinho novo, a comer castanhas, a cantar e a tocar, todos já bem bebidos, chamando a atenção das moças das aldeias. Agora a festa é outra, os tempos mudam e as formas de celebrar também. A nossa foi exemplo disso, todos bem agasalhados sentámo-nos à volta da mesa, esfregámos as mãos para podermos atacar as castanhas e os chouriços, uns mais castanhas outros mais virados para a carne, beber um vinho novo ou velho, branco ou tinto, enquanto outros se dedicavam afincadamente a assar as castanhas que teimavam em soltar umas explosões amigas para animar a malta que via os assadores profissionais cada vez mais sujos, com marcas negras de carvão na cara.

Naquele ensejo de alegria, a única nuvem que pairava nas nossas cabeças era a grande fumaça que os profissionais das castanhas não conseguiam controlar e, mesmo essa, colava-se ao tecto consciente que estava a mais e deixou-se evaporar no ar puro e gélido que o fim da tarde acentuou. Enquanto as castanhas e os chouriços chegavam à mesa, perdi-me no espaço e no tempo, ora estava sentado a comer e a beber, ora estava a percorrer as tabernas da aldeia, bebendo das canecas vinho tinto e dançava ao ritmo da debandada que me acompanhava. Ora me ria porque uma castanha estoirava e provocava um salto em uníssono na mesa, ora me ria porque estava bem bebido e tentava conquistar uma moçoila que não me passava cartão.

Num momento de conforto, tive a certeza de uma coisa, os anos passam, as tradições ajustam-se e os amigos querem-se juntos.








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