TEXTO - Rui Santos (www.cognitare.blogspot.com
A ESPERANÇA NA ESCURIDÃO
A pouco e pouco foram-se esquecendo de mim, a cada dia que passava sentia que estava mais longe de tudo e de todos, até que, num ápice, nem sei bem qual foi o momento, colocaram-me neste canto, pintado pela bruma da noite escura e solitária, protegida por uma grade preta de ferro fundido enferrujado, próprio dos encarcerados. Ainda que me tenham logrado, novamente, este local obscuro, mantenho-me viva na minha imortalidade, projetando, até onde me é possível, esta luz que sempre imanará em mim por entre os quadrados desta manta esfarrapada que me cobre.
Aqui neste cubículo claustrofóbico mantenho a minha luz acesa, por vezes, de tanta raiva que sinto, chego a ver a luminosidade no fim do túnel, chego a imaginar que alguém me chama, que alguém precisa de mim, que uma chave preta de ferro fundido abre esta armadura e a projeção da minha claridade abarcará toda uma cidade, limpando todas as nuvens negras que pairam no ar, reabrindo nas pessoas todos aqueles espaços que outrora foram meus, e assim, prosseguindo para mais uma viragem desta jornada nublosa.
Não posso dizer que fiquei espantada quando dei conta que estava, novamente, renegada a este estado, seria até inocente não o ter percebido, tamanha a minha experiência de vida, mas a crença faz-me sempre pensar que mais tarde ou mais cedo as pessoas pudessem voltar a encontrar-me, evitando mais uma temporada neste local recôndito. A cada dia fui percebendo que a minha importância se reduzia, percebia isso pelos espaços – aqueles onde outrora preenchia e revigorava a alma e a determinação das pessoas – que se fechavam nesta negrura fria que corrói os sonhos, as vontades e a estima do ser humano, deixando essa zona à mercê do desânimo.
A minha existência milenar dá-me a sapiência necessária para esperar pacientemente pela passagem deste estado de imponência, completamente dependente do Homem, que já é apanágio dos momentos mais difíceis da História. Sempre foi assim, desde os tempos das primeiras civilizações quando havia os períodos em que eu mal chegava para responder a todos os apelos, e noutros em que este canto se tornava a minha casa. A minha tarefa nestas situações é manter-me acesa, incandescente, de modo a que aos poucos, pessoa por pessoa se permita começar a sentir que eu lhe faço falta e, à medida que essa condição vai ganhando força, esta grade preta de ferro fundido enferrujado, se abra, lentamente, convidando-me a sair e fazer aquilo que me está destinado secularmente, pois onde há vida há esperança.
Sim, onde há vida à esperança..
ResponderExcluirBom texto para bela foto.
Sim. Uma bela foto que inspirou e despertou lindas palavras.
ResponderExcluirUma foto com equilíbrio visual perfeito e harmonioso.
Parabéns António